sexta-feira, 22 de julho de 2011

 Fala comigo doce como a chuva


''Chegou em casa decidida a pouco fazer. Pensou em ler livros, folhear revistas, ouvir boa música, desistiu. Quis apenas tomar o chá quentinho que fizera e comer bolachas de água e sal. Da beira da janela, observava a chuva que caía fortemente sobre os vidros.

Começou a rever ações, a julgar razões, a dar soluções, a brincar de Deus. Em pensamentos, quis ser constante, andou errante, era uma infante. Acabou com tudo, parou com o mundo, seguiu seu rumo; buscou a sorte, conquistou o Norte, encontrou a fé, continuou de pé, tornou-se mulher... Já não havia tempo... tudo era passado, tudo tinha mudado, o amor estava morrendo, a chuva caindo.

Desiludida, quisera ter paz, sossegar nunca mais, encontrar um amor, consolar-se na dor, inquietar as prisões, sentir emoções. Tudo era errado, não mais que pecado, todos mudaram, os homens mentiram; os caminhos em desconexos límpidos, os opostos gladiavam, a raiva era luxo, a saudade uma gafe, o tormento inconstante, a salvação distante, o Herói impotente. Reflexiva, estática ficara. Não havia mais desejos, ilusões, sonhos com os quais sonhar. A fé tinha chegado ao fim e a solução tornava-se, cada vez mais, irremediável. Lágrimas caíam..

As pressões a sufocam quanto mais seus sonhos eram verossímeis. Suas ações eram indignas as vontades e anseios de deus. Tudo estava por um fio. Já não mais sentia sensações, não pensava mais em emoções; tudo era vaidade, a verdade uma saudade, as máscaras perduravam, a chuva passava, seu coração acelerava.

Nesse instante, seu músculo involuntário seguiu os caminhos da chuva que havia parado. Diante de Deus, pediu pela paz, ansiou por morais, conquistou a fé, descobriu o rancor, chorou pelos céus... Tentou animar-se, fazer sua parte, sentiu um desejo, lutou por um beijo, ganhou um clamor que a solidificou. A verdade era pura ao mesmo que imatura. A mentira, um universo de sensações várias de alucinação com crises de mau amor. E só então, ela descobrira que seu destino estava arranjado, só não havia avisado. As vibrações que sentira eram as gotas doces das chuvas transformadas em lágrimas diante da paisagem que os vidros cobriam em sua casa. Justamente ali, o amor sorriu e não mais a inquietou, pois recuperara sua crendisse Nele e isso afagava seu peito, que resplandeceu de flores de jasmin e exalavam o perfume da serenidade que somente a felicidade é capaz de cumprir. Valeu a pena docemente chover.''

PS.: este texto baseia-se em reflexões do clássico de mesmo nome, do autor americano Tennessee Williams. Em sua obra, o dramaturgo faz a síntese de grande parte do desespero existencial com que trata seus personagens. A crueldade maior da história é que ela fala da desilusão do amor, da solidão e da incapacidade do ser humano em ser feliz justamente na base da sociedade: a juventude.

Livro: Fala comigo doce como a chuva
Autor: Tennesse Williams

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