O espelho, de manhã
Via-o a desgrenhar o cabelo
E do café tirava a água
Saboreando colheres de pó
Cantando o noticiário
Lavava-se com uma toalha branca
Que tinha bem desenhado
Um coração encarnado
Secava-se deslizando na banheira
Em tempo ilimitado
Saía de costas de casa
Caminhando acertado
Na direcção oposta ao emprego
E via no muro da esquina
Um coração encarnado
Desbotado
Pelos dias que se deixava ser louco
No céu voavam crianças
Penduradas em balões
Com forma de corações
Por acaso, encarnados
Sorriam-lhe com as orelhas
Diziam adeus com os pés
E ao som de grafonola
Seguiam apaixonados
Tendo destino a escola
Quando queria, punha-se louco!
De passo rouco
Arrastado, um pouco
Encontra no jardim o baloiço
Onde nos dias
Que lhe apetece ser louco
Deixa um coração cheio, grande, apaixonado
A oscilar
Entre o negro e o encarnado
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